Editorial

Desde os 11 anos, quando o saudoso Tio Magno me apresentou formalmente ao rock'n roll, eu já ouvia falar da sua morte anunciada. Felizmente o tempo segue contradizendo os boatos e o rock vai sobrevivendo e se solidificando. Continua sendo uma linha mestra para o seu público segmentado, uma mina de ouro a quem o explora de forma inteligente e uma dor de cabeça para quem por ele é criticado. Insiste em ser campeão de rentabilidade em turnês, vendas e downloads. Não cansa de ditar ideologias, comportamentos e movimentos. Apesar de uma expansão cada vez maior de outros sons e tendências, segue solitário na capacidade de criar ideologias, movimentar multidões em prol de um objetivo e fazer a gente se divertir e pensar ao mesmo tempo. Este blog é a minha maneira de agradecer ao rock'n roll pelos arrepios, suspiros, lágrimas e alegrias a mim proporcionadas até hoje. Aqui podemos discutir o rock de uma forma geral, analisar e debater seus fatos e ícones, seja por lazer ou mesmo como exercício crítico. Interaja! Mande suas postagens e sugestões, passe o blog a quem gosta de rock. Toda participação é bem vinda!! Longa vida ao rock’n roll e bom divertimento a nós todos!!

28 novembro 2010

DEEP PURPLE - CHILD IN TIME - A MARCA DE IAN GILLAN

"Deep Purple In Rock", disco no qual está "Child In Time".

Angus Young em “Let There Be Rock”, John Paul Jones em “Whole Lotta Love”, Ray Manzarek em “Light My Fire”, Neil Peart em “YYZ”. Guitarra, baixo, teclado, bateria, e atuações inesquecíveis de músicos fabulosos.

E a voz? Sempre identificamos Elvis, Freddie, Plant, Vedder, entre outros, como fantásticos vocalistas, mas raramente elogiamos a performance deles em uma determinada música. Podemos considerar a voz como “instrumento” e fazer uma classificação dos maiores desempenhos vocais da história do rock?

Penso que sim, e entre os 10 principais desempenhos tem que estar “Child in Time”, do Deep Purple. A atuação do vocalista Ian Gillan nessa canção é emblemática, demonstrando por que ele foi (e ainda é) uma das maiores vozes roqueiras de todos os tempos.

Apesar de ser uma lenda do rock pesado, Gillan sempre seguiu influências de vários estilos musicais, vindo daí sua exótica personalidade vocal: Arthur Watkins (barítono, avô de Ian), Robert Plant, Dusty Springfield, Cliff Bennet, Elvis Presley, Ray Charles... Para Ian “a inspiração vem sempre de pessoas que fizeram coisas originais”. Ritchie Blackmore, o guitarrista original do Purple, descreveu o vocal de Gillan como "gritos profundos com uma pegada de blues”.

Ian, ou “Mr. Silver Voice”, assumiu os vocais do Deep Purple em 1969, no lugar de Rod Evans, após ter sido assistido à frente da banda “Episode Six”. Depois de sair do Purple, em 1973, esteve em carreira solo e foi integrante do Black Sabbath, gravando com os caras o disco “Born Again”, em 1983. Felizmente sua volta definitiva à banda que o consagrou aconteceu em 1992.

Ian é uma figuraça... Pude vê-lo ao vivo com o Purple em 2006, em Porto Alegre (memorável). Carismático, Ian passa o espetáculo inteiro elogiando a platéia (“You are absolutely fantastic...”), canta de pés descalços e nunca perde a chance de fazer uma piada. Ian foi apelidado de “Naked Thunder” na década de 70, pois cantava nu durante as gravações para “se sentir mais à vontade”.

“Child in Time” faz parte do sensacional “Deep Purple in Rock”, de 1970, o quarto disco estúdio do Purple, um dos 100 maiores álbuns da história do Rock e o preferido de Bruce Dickinson, vocalista do Iron Maiden. Foi gravado de agosto de 1969 a junho de 1970 em 3 estúdios britânicos, entre eles o lendário Abbey Road. As influências mais fortes foram os Yardbirds, o Led Zeppelin e os Beatles, além, é claro, do intenso cenário psicodélico da época.

Faixa 03 do lado “A” do finado vinil de “In Rock”, “Child in Time” é uma canção épica de 10min15seg. Sua letra simples e curta é um protesto contra a guerra do Vietnã e o massacre de jovens nos conflitos.

No álbum original o encarte traz a música com o subtítulo “A story of a looser – it could be you” (A história de um perdedor – ele poderia ser você), deixando seu recado sobre a perda insensata de vidas.

A tradução de “Child in Time” é mais ou menos a seguinte: “Doce criança no tempo, você verá a linha, a linha desenhada entre o bem e o mal; Veja o homem cego atirando no mundo; Balas voando, levando tristeza; Se você tem sido mau, Deus eu aposto que sim, e você foi atingido por uma bala perdida, seria melhor fechar seus olhos, inclinar a cabeça e aguardar pelo ricochete”

Outra característica de “Child in Time” é comum às músicas lendárias de longa duração: trata-se de de uma canção diferente, e em especial cíclica. O vocal varia do suave ao estridente, do sussurro ao grito, com intensidade maior indo e voltando. Na mesma via seguem as performances de teclado e guitarra. Para que a canção tivesse ares realmente diferentes, o guitarrista Ritchie Blackmore trocou sua habitual Fender Stratocaster por uma Gibson nas gravações de estúdio, a fim de encorpar ainda mais a música.

Gillan resumiu as origens de “Child in Time” em sua biografia: “A música é inspirada na canção 'Bombay Calling', de uma desconhecida banda chamada 'It's A Beautiful Day'. Pensamos em brincar com a canção, modificá-la e fazer algo novo, mas mantendo-a como base.”

Reza a lenda que o tecladista Jon Lord estava meditando e experimentando notas no teclado, quando de repente Gillan começou a cantar, do nada, “Sweet Child In Time, You'll See The Line...”. Pelo que pesquisei, ao que parece “Child In Time” foi originada exatamente assim: naturalmente, em uma enorme presença de espírito conjunta.

Na minha opinião, a melhor versão de “Child in Time” está no disco “Made In Japan”, gravado ao vivo em 15, 16 e 17/08/1972. O álbum é uma referência e para muitos é top 10 entre os shows de rock em todos os tempos. A frase de Homer Simpson em um episódio da série:“Todo mundo sabe que o rock atingiu a perfeição em Agosto de 1972”, refere-se ao álbum.

Infelizmente “Child in Time” foi tocada pela última vez em shows do Purple em 2002, mas desde 1993 raramente aparece nos setlists. A justificativa do próprio Gillan é que, com o passar dos anos, cantá-la sem qualquer recurso tecnológico, back vocals de apoio ou cobertura da guitarra tornou-se praticamente impossível.

Abaixo, então, outra grande performance de Ian Gillan em “Child in Time”, nos estúdios da BBC de Londres, em 1970. Na oportunidade, o Deep Purple tocava com sua segunda formação, apelidada de “Mark II”, para muitos a melhor da banda em todos os tempos: John Lord, Ian Paice, Ritchie Blackmore, Roger Glover e Ian Gillan.

O som não está cinco estrelas, mas o nível é suficiente para arrepiar com a performance de Gillan e de toda a banda. Abraços a todos!

2 comentários:

dudio disse...

Essa banda pirou minha cabeça aos 12 anos de idade.
Abs
Duarte ( Corpore )

Boo disse...

Também acho Ian Gillan um dos melhores vocalistas de todos os tempos, e apesar de achar Child in Time uma música fudida acho que a melhor interpretação do Gillan é em Disturbing The Priest, do Born Again.